Relação entre o estado psicossocial do cuidador
informal e o tempo de cuidado dos idosos da
região centro de Portugal*
Ricardo Pocinho
1
http://orcid.org/0000-0003-1307-5434
Escola Superior de Tecnologia da Saúde de Coimbra, Portugal
Pedro Belo
2
http://orcid.org/ 0000-0003-1729-9566
Escola Superior de Tecnologia da Saúde de Coimbra, Portugal
Cláudia Melo
3
Escola Superior de Tecnologia da Saúde de Coimbra, Portugal
Esperanza Navarro-Pardo
4
http://orcid.org/ 0000-0002-9355-2909
Universidad de Valencia, España
Juan José Fernández Muñoz
5
http://orcid.org/0000-0001-5519-7515
Universidad Rey Juan Carlos, España
DOI: http://dx.doi.org/10.17081/eduhum.19.32.2533
Recibido: 10 de julio de 2016 Aceptado: 15 de octubre de 2016
Relation between informal caregivers and the time
spent on elder care in the centre of Portugal
Resumo
O papel desempenhado pela família e cuidadores no tratamento dos idosos é es-
sencial para a promoção e manutenção da sua qualidade de vida, garantindo a sua
manutenção do domicílio por um período de tempo mais alargado. Objetivo: Com-
preender a existência da sobrecarga do cuidador informal e os fatores associados
(apoio disponíveis e perl), bem como estudar o estabelecimento relacional entre o
tempo e a sobrecarga. Metodologia: Um questionário de dados sociodemográcos e
QASCI (Questionário de Avaliação da Sobrecarga do Cuidador Informal) aplicado
a 30 cuidadores da região centro de Portuga. Resultados: São caraterísticas do perl
do cuidador, 45 anos, casado, existência de coabitação e razões relacionadas com o
dever e a ligação emocional subjacente.
Abstract
The role played by family and peers, in care for older people is fundamental to the
promotion and maintenance of their well-being and their quality of life, ensuring
their stay at home as long as possible. Objective: To understand the existence of the
informal caregiver problem and associated factors (support, prole). Methodology:
for a sample of 30 informal caregivers of seniors was applied and a sociodemograph-
ic questionnaire and the QASCI (Evaluationquestionnaire of the Informal Caregiver
Overload). Results: The results suggested a caregiver prole characterized by age
over 45 years, married, existence of cohabitation and underlying grounds relating to
the duty and the emotional connection.
Palavras-chave:
Cuidador informal, Idoso,
Stress, Apoio social, Demência.
Keywords:
Informal caregiver, Elder,
Stress, Social support, Dementia.
Referencia de este artículo (APA): Pocinho, R., Belo, P., Melo, C., Navarro-Pardo, E. & Fernández, J. (2017). Relação entre o estado
psicossocial do cuidador informal e o tempo de cuidado dos idosos da região centro de Portugal. En Revista Educación y
Humanismo, 19(32), 88-101. http://dx.doi.org/10.17081/eduhum.19.32.2533
* O artigo referente à linha de pesquisa Envelhecimento e Administração Social, nanciado por Coimbra Business School.
1. Escola Superior de Tecnologia da Saúde de Coimbra, Portugal. pocinho@estescoimbra.pt |
2. Escola Superior de Tecnologia da Saúde de Coimbra, Portugal. pedro.belo.santos@gmail.com
3. Escola Superior de Educação de Coimbra, Portugal. claudiarafamello@gmail.com
4. Universidad de Valencia, España. Esperanza.Navarro@uv.es
5. Universidad Rey Juan Carlos, España. juanjose.fernandez@urjc.es
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Introdução
O envelhecimento é um fenómeno transversal
a todas as culturas. Contudo, a denição de
velhice é algo complexa. A conceção de pessoa
idosa deriva, por norma, da xação de uma idade
cronológica que está entre os 60 e os 65 anos
(OMS, 1993). Numa outra perspetiva, meramente
siológica, a velhice é denida como um processo
de falência reprodutiva (menopausa/andropausa)
causadora de uma progressiva disfunção genera-
lizada, que resulta numa signicativa perda
da capacidade adaptativa ao ambiente (Coles,
1996). Segundo Weineck (2001), é a soma de
todas as alterações biológicas, psicológicas e
sociais, que depois de alcançar a idade adulta
e ultrapassar a idade de desempenho máximo,
levará a uma redução gradual das capacidades
de adaptação e do desempenho psicofísico do
indivíduo. Na perspetiva de Fraiman (1995), a
velhice é um “momento na vida do indivíduo,
e um processo extremamente complexo e pouco
conhecido, com implicações tanto para quem o
vivencia como para a sociedade que o suporta ou
assiste a ele” (p.19).
Costa (2002) acrescenta um novo conceito, a
senescência, ao dizer que o envelhecimento é um
processo segundo o qual o organismo biológico
existe no tempo e muda sicamente, sendo
que dele resulta um comprometimento físico e
cognitivo, com aumento da vulnerabilidade e
probabilidade de morte.
Pode-se ainda dizer que o envelhecimento
se traduz na diminuição das capacidades de
adaptação ao meio e às agressões de vida. A
avaliação da velocidade de processamento é de
extrema importância no envelhecimento, pois
é um dos primeiros processos a diminuir nos
estágios iniciais de demência nesta fase da vida
(Faria, Alves & Charchat-Fichman, 2015).
Segundo Lampert e Rosso (2015) na velhice,
a depressão é a doença psiquiátrica mais comum
sendo que 23 %-40 % da população idosa na
comunidade tem esse diagnóstico, por outro
lado, entre os institucionalizados a taxa de preva-
lência da mesma é de 54 %.
Constata-se, assim, a ausência de uma expli-
cação única para o envelhecimento, visto que este
é um processo multifatorial e multidimensional.
Designadamente, existem diversas dimensões a
considerar quando se procura analisar a pessoa:
a biológica, psicológica e sociológica, sendo
que todas elas interagem com o meio ambiente
(Moniz, 2003).
Do ponto de vista teórico, para Fernández
-Ballesteros (2000) são variadas as teorias
que procuram explicar o envelhecimento, de
acordo com a sua faceta biológica (e.g., teorias
genéticas), psicológica (e.g., teorias do desenvol-
vimento) ou sociológica (e.g., teoria da desvin-
culação), das quais derivam diversas dimensões
do envelhecimento (biológico - alteração
progressiva das capacidades; psicológico –
mudanças ao nível do pensamento e compor-
tamento; sociológico – alteração dos papeis
sociais). Salgado (1982) assume uma abordagem
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integradora da velhice, entendendo-a como uma
etapa da vida na qual, em consequência da idade
cronológica elevada, se vericam modicações
de ordem biopsicossocial que afetam a relação
entre individuo e meio. Existe uma quebra nas
relações familiares e interpessoais, que provoca,
igualmente, uma menor qualidade de vida, uma
vez que os idosos têm que se familiarizar com
o viver sozinhos ou equacionar a possibilidade
de perda de independência. Deste modo, não só
não se sentem úteis no âmbito familiar, como
muitas das vezes é necessário que alguém cuide
deles devido problemas de saúde derivados da
idade. O processo de envelhecimento surge
acompanhado de um declínio leve no funcio-
namento cognitivo e uma queixa subjetiva de
memória torna-se frequente na população idosa,
podendo estar associada a mudanças no humor
e/ou cognitivas e que incrementa a possibilidade
de demência (Brigola et al., 2015).
Com o aumento da qualidade de vida, da
melhoria das condições de vida, aumento da
esperança média de vida, a par com a taxa de
envelhecimento, colocaram a sociedade perante
uma população maioritariamente envelhecida.
Vários fatores têm vindo a congurar o cenário
que carateriza atualmente a terceira idade;
a estrutura familiar alargada que ilustrava o
nosso país há algumas décadas atrás (e que
consistia na coabitação de várias gerações que
cuidavam umas das outras, assegurando uma
velhice com um mínimo de suporte) deu lugar
a um núcleo familiar restrito; a entrada genera-
lizada da mulher no mundo do trabalho; o
ritmo de vida frenético dos nossos dias; o tipo
de habitação em prédios; a vida impessoal das
cidades, entre outros motivos, vieram acentuar
uma série de circunstâncias de carência em
que muitos idosos se encontram, implicando a
necessidade de se encontrar respostas para esta
faixa da população, na qual, ainda que deva ser
contrariada uma imagem de velhice negativa, é
inegável a existência de um conjunto de proble-
máticas, particularmente associadas à saúde, a
que é necessário atender. Associadas ao funcio-
namento cognitivo na velhice, sendo que a
memória é a função cognitiva mais afetada, surge
a fraqueza muscular e a perda de mobilidade. O
comprometimento cognitivo é mais prevalente
nos idosos frágeis, e quanto maior a fragilidade,
maior o risco de demência. A presença conco-
mitante de fragilidade e mudanças cognitivas
podem auxiliar a prever a mortalidade nos idosos
(Brigola et al., 2015).
Ainda que as respostas para esta população
surjam exteriores à família, esta continua a deter
um papel fulcral no cuidado ao idoso. Se numa
primeira fase, o apoio ao idoso se centra na
rede social próxima, constituída por familiares,
amigos e vizinhos, um conjunto de constrangi-
mentos pessoais, históricos, sociais e culturais,
alteraram a forma de perspetivar a terceira
idade ao longo do tempo, alterando conceções,
necessidades e respostas, fazendo surgir as
instituições direcionadas para o acolhimento
de idosos (Guimarães, 1999), que frequente-
mente coexistem com os cuidadores no apoio
à terceira idade. Ainda que o poio social tome
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um papel de destaque na sociedade atual, quer
por motivos nanceiros, seja por questões de
vínculo familiar, muitos idosos encontram-se ao
cuidado de alguém ou em situações mistas.
Esta é uma atividade complexa, quer pela sua
dimensão psicológica quer pela dimensão social,
ética e demográca, albergando vários aspetos de
ordem clínica, técnica e comunitária. Cuidar de
alguém passa por garantir o seu bem-estar, a sua
saúde, alimentação, higiene pessoal, e aspetos
como a recreação e lazer (Garcia, 2013). Cuidar
implica a responsabilidade de tomar conta de
alguém, satisfazer/responder às suas necessi-
dades e sentir preocupação, interesse, consi-
deração e afeto pela pessoa de quem se cuida
(Sequeira, 2010). Braithwaite (2000, citado
por Martins, Ribeiro & Garrett, 2003) dene
Cuidador Informal (CI) como “a pessoa não
remunerada, familiar ou amiga que se assuma
como principal responsável pela organização
ou assistência e prestação de cuidados à pessoa
dependente” (p.137).
Importa distinguir cuidadores principais -
aqueles que têm a seu cargo toda ou grande parte
da responsabilidade pelos cuidados à pessoa
idosa no domicílio, realizando todas as tarefas
que este não consiga desenvolver, de cuida-
dores secundários - vizinhos, voluntários e/ou
mesmo alguns familiares que prestam cuidados
de uma forma parcial, e esporádica. De modo
semelhante, existem cuidadores formais e cuida-
dores informais, sendo os primeiros prossionais
pagos pelos seus cuidados prestados à pessoa
idosa e normalmente possui formação para tal,
e os segundos familiares, vizinhos, amigos que
prestam cuidados à pessoa idosa sem serem
remunerados por tal atividade (Sequeira, 2010).
Normalmente o ato de cuidar recai sobre um
único membro da família, o cuidador primário,
associado na maior parte das vezes ao cônjuge ou a
descendência direta; estes são, maioritariamente,
mulheres (Marques, 2000), numa lógica cultural
em que é a mulher que assume um papel ativo na
prestação de cuidados, a par com a realização de
tarefas domésticas (Nakatano, Souto, Paulette,
Melo & Sousa, 2003); a coabitação está direta-
mente associada ao estado civil do prestador de
cuidados pois o dividir a habitação com a pessoa
idosa incapacitada expõe o cuidador à realidade
do idoso, levando-o a tornar-se cuidador; quanto
aos motivos que levam ao cuidador informal,
são apontados a preocupação em evitar a insti-
tucionalização, constituindo um último recurso
(Jani-le-Bris, 1994); em termos prossionais,
são maioritariamente domésticos e reformados
da sua antiga prossão. Figueiredo (2007) refere
que os motivos subjacentes à assunção do papel
de cuidador a um idoso dependente constituem
um domínio complexo que envolve uma misce-
lânea razões, marcado pelas tradições, pelos
padrões e normas sociais vigentes em cada
cultura, pela conceção de vida e história de cada
indivíduo.
Cuidar apresenta duas componentes
principais: trabalho emocional, que envolve a
relação dual entre o idoso e o cuidador e trabalho
de gestão e de organização das atividades diárias
que o idoso deverá realizar. Tomar conta de um
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parente idoso dependente pressupõe o envol-
vimento emocional, esforço físico e dispêndio
de tempo e energia, que dicilmente podem ser
entendidos como algo insignicante na vida dos
indivíduos, acarretando, habitualmente, custos
elevados para a saúde e para o bem-estar do
cuidador. O impato pode acontecer na esfera
objetiva - familiar, social, económica e pros-
sional, ou subjetiva - respostas emocionais
(Figueiredo, 2007).
Para Maslach, Schaufeli e Leiter (2001) o
burnout, ou esgotamento, poderá manifestar-se
em exaustão física, emocional e despersonali-
zação. Benevides-Pereira (2002) refere que os
sintomas desta síndrome podem ser divididos
em físicos/emocionais (sensação de fadiga
constante, perturbação do sono, etc.) ou compor-
tamentais (Irritabilidade, incapacidade de
relaxar, aumento do consumo de bebidas alcoó-
licas, suicídio).
Problema de Investigação
O objetivo desde trabalho pretendeu analisar
a relação existente entre o cuidador informal e o
tempo de suporte social despendido nos cuidados
com a população idosa.
O grau de exigência dos cuidados inuencia
o quotidiano do cuidador, alterando, frequente-
mente a sua qualidade de vida. Esta noção surge,
para a Organização Mundial de Saúde (1993),
como a perceção do indivíduo de sua posição
na vida, no contexto cultural e de sistemas de
valores no qual vive e em relação às suas metas,
expetativas, valores e preocupações. A sobre-
carga constitui uma resposta psicossocial, uma
consequência que inclui a diminuição de senti-
mentos de bem-estar, stresse e um aumento dos
problemas de saúde (Pearlin, Mullan, Semple
& Skaff, 1990; Figueiredo, 2007; Vitaliano,
Scanlan & Zhang, 2003). A qualidade de vida
do cuidador assume contornos positivos ou
negativos, consoante as estratégias adaptativas
que põe em prática e os recursos que mobiliza
e ativa, face aos constrangimentos de cuidar
de alguém dependente. A investigação que tem
vindo a ser desenvolvida acerca dos cuidadores
informais tem dado especial atenção às conse-
quências negativas que advêm da experiência de
cuidar (Jenaro, Grueso, Flores, Navarro-Pardo &
Vázquez-Martínez, 2013). No entanto, este fato
dá uma imagem muito redutora desta experiência,
pois exclui os impatos positivos; a prestação de
cuidados não pode ser vista apenas como uma
fonte stressante, mas também como uma fonte
de graticação e realização pessoal. Na experi-
ência de cuidar existem “aspetos potencialmente
satisfatórios e graticantes da situação de prestar
cuidados a um familiar” (Brito, 2002, p.45).
As recompensas ou as experiências positivas
na experiência do cuidar incluem um sentido
de satisfação, de graticação e de orgulho no
papel de cuidar, aumento do sentido de domínio,
competência e realização, bem como um sentido
de nalidade e signicado para a vida (Dupuis,
Epp & Smale, 2004). Estes autores acrescentam
ainda os benefícios emocionais, o sentimento
de reciprocidade, o crescimento e desenvol-
vimento pessoal e o aumento da qualidade no
relacionamento social, (sobretudo, com o recetor
de cuidados) como aspetos graticantes que
derivam da experiência de cuidar.
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RicaRdo pocinho, pedRo Belo, cláudia melo, espeRanza navaRRo-paRdo, Juan José feRnández muñoz
93
Em termos formais, existem três tipos de
programas de suporte direcionados aos cuida-
dores: grupos de apoio; grupos de aprendizagem
conduzidos por prossionais; grupos de aconse-
lhamento/acolhimento, que, atendendo às neces-
sidades de cada idoso/cuidador, permitem reduzir
o isolamento, aumentar conhecimentos sobre o
processo de envelhecimento e os problemas de
saúde especícos para cada situação, melhorar
o desempenho do cuidador através de habili-
dades e estratégias, visando o bem-estar físico,
emocional do cuidador e a redução da sua sobre-
carga, melhorando a sua Qualidade de Vida.
Metodologia
A amostra foi constituída por 30 Cuida-
dores Informais (CI) de idosos da zona centro
de Portugal (Coimbra e Pombal). Fizeram parte
da amostra de estudo apenas os prossionais que
concordaram com o Termo de Consentimento
apresentado, o qual assegurava a questão de
anonimato e condencialidade.
Os instrumentos aplicados foram um Ques-
tionário Sociodemográco e o QASCI Ques-
tionário de Avaliação da Sobrecarga do Cuida-
dor Informal (Martins, Ribeiro & Garrett, 2003).
Este é composto por 32 itens, avaliados numa
escala do tipo Likert. Inclui 7 dimensões: Impli-
cações na Vida Pessoal do cuidador (11 itens);
Satisfação com o Papel e com o Familiar (5
itens); Reacções a Exigências (5 itens); Sobre-
carga Emocional relativa ao familiar (4 itens);
Suporte Familiar (2 itens); Sobrecarga Finan-
ceira (2 itens) e a Perceção de Mecanismos de
Ecácia e de Controlo (3 itens). Em três subes-
calas (Satisfação com o Papel e com o Familiar,
Suporte Familiar e Perceção de Mecanismos de
Ecácia e de Controlo), as pontuações são inver-
tidas (Martins, Ribeiro & Garrett, 2003).
A subescala Implicações na Vida Pessoal pre-
tende avaliar as repercussões sentidas pelo cui-
dador por estar a cuidar do seu familiar, como
seja a diminuição de tempo disponível para si,
sentir a sua saúde e a sua vida social serem afe-
tadas, sentir um grande esforço físico por estar a
tomar conta da pessoa dependente e deparar-se
com planos alterados na sua vida, bem como,
a sensação de estar preso (Martins, Ribeiro &
Garrett, 2003). A subescala Satisfação com o Pa-
pel e com o Familiar diz respeito a sentimentos
e emoções positivas, aumento de auto-estima e
sentir-se mais próximo do doente, decorrentes
do desempenho do papel e da relação afetiva
que o cuidador estabelece com o sujeito alvo dos
cuidados (Martins, Ribeiro & Garrett, 2003).
A subescala Reacções a Exigências inclui sen-
timentos negativos, como a perceção de mani-
pulação por parte do doente, ou a presença de
comportamentos por parte deste capaz de levar
a embaraço do cuidador, sentimentos de ofen-
sa e diminuição da privacidade. A Sobrecarga
Emocional compreende emoções negativas do
cuidador, que podem levar a conitos internos e
sentimentos de fuga, cansaço e esgotamento pe-
rante a situação em que se encontram (Martins,
Ribeiro & Garrett, 2003). O Suporte Familiar diz
respeito ao reconhecimento e apoio que a famí-
lia disponibiliza ao cuidador. À subescala Sobre-
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carga Financeira estão inerentes as diculdades
económicas decorrentes da situação de doença
do familiar e à incerteza do futuro económico. A
subescala Perceção de Mecanismos de Ecácia e
de Controlo compreende aspetos que capacitam
ou facilitam ao cuidador continuar a enfrentar os
problemas que advêm do desempenho de papel,
como sejam, a capacidade para tomar conta do
doente dependente e os conhecimentos e experi-
ência para assumir a responsabilidade do cuida-
do (Martins, Ribeiro & Garrett, 2003).
Resultados
O questionário mostou boa consistência
interna, apresentando um alfa de Cronbach de
0.90.
De seguida será feita a análise descritiva
dos dados sociodemográcos, os quais estão
presentes na Tabela 1.
No que toca à idade, verica-se que a
totalidade da amostra se insere numa faixa etária
acima dos 40 anos (46-83), sendo que 60 % tem
menos de 60 anos. A maioria dos cuidadores
informais é do sexo feminino (N=27; 90 %) e 60 %
(N=18) estão casados. Na amostra estudada,
16,7 % (N=5) sujeitos são solteiros, enquanto
23,3 % da amostra é cuidador há menos de 2 anos
(N=7) e 30 % (N=9) exerce essa atividade entre
2 e 5 anos. Na amostra 7 cuidadores (23,3 %)
cuida entre 5 e 10 anos de alguém e a mesma
percentagem foi encontrada com funções de
cuidados mais de 10 anos. Vericamos que 17
sujeitos (56,7 %) são o único cuidador da pessoa,
enquanto 13 (43,3 %) tem apoio de outrem.
Tabela 1. Perl dos cuidadores informais (N=30)
N %
Idade
<40 anos 0 0%
> 40 anos 30 100%
Género
Feminino 27 90%
Masculino 3 10%
Prossão
Espec. intelectuais
cientícos
4 13,3%
Técn. nível intermedio 4 13,3%
Adm. e similar 3 10%
Serv. e vendedores 6 20%
Não qualicados 3 10%
Reformados 10 33%
Estado civil
Solteiro 5 16,7%
Casado 18 60%
Divorciado 4 13,3%
Viúvo 3 10%
Parentesco
Cônjuge 6 20%
Filha/lho 18 60%
Nora 2 6,7%
Irmã/irmão 2 6,7%
Não tem 2 6,7%
Coabitação
Sim 21 70%
Não 9 30%
Tempo
<2 anos 7 23,3%
2-5 anos 9 30%
5-10 anos 7 23,3%
> 10 anos 7 23,3%
Único cuidador
Sim 17 56,7%
Não 13 43,3%
Motivos
Dever-Dependência 8 26,7%
Dever-Parentesco 15 50%
Características instituições 1 3,3%
Valorização-lar 2 6,7%
Financeiros 1 3,3%
Prossionais 1 3,3%
Relativamente à prossão, 33 % dos sujeitos
(N=10) estão reformados; vericaram-se ainda 4
(13,3 %) especialistas nas prossões intelectuais
e cientícas, assim como técnicos e prossionais
de nível intermédio.
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95
Atendendo ao grau de parentesco, 18 sujeitos
(60 %) são lhos da pessoa cuidada e 6 (20 %)
são o cônjuge. Assim, sendo a maioria dos cuida-
dores mulheres, e a maioria dos cuidadores são
lhos das pessoas cuidadas, isso signica que
a tarefa social de cuidar do idoso é geralmente
atribuída às lhas dos idosos.
No que diz respeito à continuidade do
cuidado, existem na amostra 20 sujeitos (66,7
%) que prestam os cuidados em continuidade.
O motivo principal para prestar este cuidado
prendese com o grau de parentesco para com o
idoso (N=15).
Quanto à análise dos apoios disponibilizados
aos cuidadores informais, foram encontrados os
seguintes resultados, indicados na Tabela 2.
Tabela 2. Apoios disponibilizados aos
Cuidadores Informais (N=30)
N %
Acesso Informação
patologia
Sim 13 43,3%
Não 17 56,7%
Onde informação
Instituições Apoio 13 43,3%
Hospital/Médicos 9 30%
Formação Prossional 2 6,7%
Outros 2 6,7%
Participação
Formação patologia
Sim 6 20%
Não 24 80%
Participação
Formação cuidador
Sim 4 13,3%
Não 26 86,7%
Informação
Associações apoio
Sim 10 33,3%
Não 20 66,7%
Grupo partilha
Sim 6 20%
Não 24 80%
Contacto
Prossionais
Sim 23 76,7%
Não 7 23,3%
Onde
Hospital/centro saúde 13 43,3%
Prossionais de
associações
9 30%
Esporadicamente médico 2 6,7%
Prossionalmente 2 6,7%
Adaptação espaços
Sim 10 33,3%
Não 20 66,7%
Apoio económico
Sim 3 10%
Não 27 90%
Apoio Jurídico
Não 29 96,7%
Sim 1 3,3%
Outro apoio
Sim 7 23,3%
Não 22 73,3%
Da amostra analisada, 13 sujeitos (43,3 %)
obtiveram informação sobre a patologia da
pessoa de quem cuidam, nos seguintes locais:
instituições de apoio (N=13; 43,3 %), hospital/
médicos (N=9; 30 %). A amostra apresenta 80 %
dos cuidadores (N=24) que não tiveram formação
sobre a patologia da pessoa a seu cuidado.
Relativamente à formação do cuidador,
apenas 4 sujeitos (13,3 %) tiveram nesse grupo
de apoio. Quanto ao conhecimento de programas
no âmbito da patologia da pessoa cuidada,
apenas 10 sujeitos (33,3 %) tiveram informação,
todos eles em associações relacionadas (e.g.,
centro de dia). Relativamente ao conhecimento
de associações de apoio, 66,7 % (N=20) não
tiveram informação sobre este tipo de insti-
tuições. Apenas 6 sujeitos (20 %) integram
grupos de partilha, ainda que a maioria (N=23;
76,7 %) contacte com prossionais que podem
esclarecer dúvidas eventuais.
Para exercer o cuidado à pessoa a seu cargo,
apenas 33,3 % (N=10) da amostra precisou
de fazer alterações na sua residência, sendo
sobretudo no quarto da pessoa cuidada.
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Procurou-se ainda perceber a disponibilidade
dos sujeitos para participar em ações informa-
tivas e de formação através da importância a elas
atribuída; 90 % da amostra (N=27) considerou ser
“muito importante” ter acesso a informação sobre
a patologia da pessoa de quem cuidam; 25 sujeitos
(83,3 %) consideraram “muito importante” parti-
cipar em formações nesse âmbito; 24 sujeitos
(80 %) tiveram a mesma opinião tratando-se de
formações para o cuidador e 25 sujeitos (83,3
%) sobre ter informação acerca de associações
vocacionadas para essa questão. Na amostra
analisada 63,3 % dos sujeitos (N=19) respon-
deram ser “muito importante” a participação
em grupos de partilha e 25 cuidadores (83,3 %)
pensam o mesmo sobre o contato com pros-
sionais de referência.
Para a avaliação da sobrecarga do cuidador
os resultados estão indicados na Tabela 3.
Tabela 3. Média e desvio-padrão das respostas
dadas pelos cuidadores informais na escala
QASCI e suas dimensões (N=30)
Média DP
Sobrecarga Emocional relativa ao familiar 27,92 1,44
Implicações na Vida Pessoal do familiar
cuidador
48,56 0,04
Sobrecarga Financeira 31,67 1,08
Reações às Exigências 60,00 8,40
Perceção dos Mecanismos de Ecácia e
Controlo
35,56 2,89
Suporte Familiar 27,92 7,23
Satisfação com o Papel e com o Familiar 21,27 7,23
QASCI Total 37,7 2,13
Ainda que não existam pontos de corte
estabelecidos, é sugerida a seguinte (Loureiro
et al., 2013) análise normativa: “0 = Ausência
de Sobrecarga”; “1-25 = Sobrecarga Ligeira”;
“25-50 = Sobrecarga Moderada”; “50-75 =
Sobrecarga Grave”; e “>75 Sobrecarga Extre-
mamente Grave”.
Assim, considerando a escala global, a média
de pontuação obtida foi de 37.7 (dp=2.13),
correspondendo a uma sobregarga moderada.
Atendendo a uma perspetiva mais especíca, por
subscala, apenas na satisfação com o papel e com
o familiar a amostra apresenta uma sobrecarga
ligeira (média= 21.27; dp= 7.23); na reação às
exigências, os sujeitos da amostra surgem como
tendo uma sobrecarga grave (média= 60.00;
dp= 8.4), sugerindo a presença de sentimentos
negativos, como a perceção de manipulação
por parte do doente, sentimentos de ofensa e
diminuição da privacidade; nas restantes substa-
calas, a amostra apresenta uma sobrecarga
moderada.
Foi estudada a relação existente entre a
sobrecarga do cuidador informal e o tempo de
prestação de cuidado através do r de Pearson,
estando os resultados indicados na Tabela 4.
Tabela 4. Correlação entre a QASCI
e suas dimensões e características do
cuidado/apoios existentes
SE IVP SF RE PMEC SFM SPF QASCI
TC -,015 -,046 -,065 ,089 ,287 ,146 ,382* ,093
* p< 0.05
O tempo de prestação de cuidado correlacio-
nou-se de forma signicativa e positiva com o
papel e satisfação com o familiar (r=.382; p<.05).
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Discussão
O fato dos cuidadores o serem a tempo
inteiro surge como fator de satisfação com esse
papel para com a pessoa cuidada. O tempo de
prestação de cuidado correlacionou-se, neste
estudo, de forma positiva, com o papel e satis-
fação com o familiar, sugerindo a presença de
emoções positivas decorrentes da ligação “pessoa
cuidada” - “cuidador”. Tal, surge reforçado
quando vericamos que os motivos que levam
estes cuidadores a desempenhar este papel se
prende fortemente com a ligação emocional já
existente. O estudo de Dávila e Morejón (2012)
permite perceber que é a ligação emocional que
fornece uma estrutura propícia para a compre-
ensão do mundo afetivo dos idosos.
Por outro lado, um maior apoio social pode
lançar as bases para uma melhor perceção de
saúde, o que em conjunto diminuiu o stress,
prevenindo o desenvolvimento de depressão
entre os cuidadores (Junior, Blumentahl &
Garner, 2015).
O stress crônico experimentado pelos cuida-
dores, está associado a um humor negativo
(Leggett, Zarit, Kim, Almeida & Klein, 2015),
pelo que o fato de surgir um ponto de satisfação
pessoal pode eliminar este tipo de humor, tal
como foi encontrado nos nossos resultados.
De acordo com o estudo de Williams,
Zimmerman (2011), mais de metade dos cuida-
dores familiares fazem a monitorização, gestão
e assistência com as refeições e 40 % auxiliam
nas tarefas de cuidados pessoais. Quando este
envolvimento se relaciona com uma necessidade
percebida, não se encontrando na amostra humor
negativo, nem depressão.
Ainda assim, a amostra estudada apresentou,
na generalidade, uma sobrecarga moderada,
destacando-se com maior impacto a reação às
exigências, ou seja, a a presença de sentimentos
negativos, como a perceção de manipulação
por parte do doente, sentimentos de ofensa
e diminuição da privacidade. Neste sentido,
a existência de programas comunitários de
educação e suporte destinados aos cuidadores,
constituem um importante recurso na otimi-
zação das ferramentas ao dispor do cuidador, e
na manutenção da sua própria saúde e bem-estar.
Esta ideia parece suportada pelos nossos resul-
tados, 80 % dos sujeitos consideraram muito
importante a existência destes tipos de apoio.
Os cuidadores com mais tempo de serviço
apresentam níveis mais baixos de rigidez e estão
melhor informados sobre os serviços, passando a
compartilhar responsabilidades de cuidar, o que
vem ao encontro da satisfação pessoal (Herrera,
Lee, Palos & Torres-Vigil, 2008).
Conclusão
Ainda que as respostas sociais para a terceira
idade tenham vindo a aumentar, existem idosos
que permanecem junto de familiares, ou outras
pessoas signicativas que assumem o papel de
cuidadores. Num momento mais avançado, o
idoso poderá depender integralmente de um
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cuidador, frequentemente parente ou pessoa
próxima.
A nível pessoal, os cuidadores cam sem
tempo para si próprios, para os outros que lhe
estão próximos e para o desenvolvimento de
atividades sociais e culturais; alguns cuidadores
mantêm a sua atividade laboral, sem qualquer
tipo de restrição ou adaptação, mas outros há
que têm de abdicar da mesma; numa situação
intermédia, têm de fazer alguns ajustamentos
mas conseguem conciliar os cuidados e a vida
prossional (Sequeira, 2010; Isaac, Stewart &
Krishnamoorthy, 2010). O grau de dependência
dos idosos é ligeiro ou porque seja possível
recorrer a serviços formais ou informais comple-
mentares; ao nível nanceiro, algumas situações
implicam um dispêndio elevado de dinheiro,
habitualmente suportado pelo próprio idoso; o
facto de os cuidadores necessitarem de responder
às exigências colocadas pelos idosos e às solici-
tações dos outros familiares tem implicações
relacionais, podendo a própria relação com o
idoso que é cuidado ser ambígua e potenciadora
de situações de stress (Sequeira, 2010; Isaac,
Stewart & Krishnamoorthy, 2010). Estas ideias
apontam a necessidade de estudar o impacto
no cuidador desta atividade e de lhe garantir
mecanismos capazes de atenuar estas reper-
cussões, que ao inuenciarem a sua qualidade de
vida, alcançam, também, a pessoa cuidada.
Explana-se a importância da família no
cuidado à pessoa dependente, visto como um
dever relacionado com a afetividade. No entanto,
as respostas dos cuidadores parecem sugerir que
as ofertas exteriores ao domicílio não serão,
também, as mais adequadas e possíveis de
comportar, carecendo da componente emocional,
quer implicando custos superiores ao possível
para a maioria das pessoas. De facto, nem sempre
os mecanismos disponíveis, quando os há, são os
mais adequados, ou estão ao alcance de todos, tal
como refere Iecovich (2008).
No entanto, os familiares cuidadores de
idosos com demência, ainda que sentindo satis-
fação por este papel, estão sujeitos a inúmeras
fontes de stress, decorrente da assunção de um
papel para qual, frequentemente, não estão
preparados, assim como das repercussões na sua
vida diária (Ramos, 2004).
A perceção de que a população idosa existe,
cada dia que passa em maior número, torna
urgente que se considerem recursos para esta
faixa da população, nomeadamente no que
respeita à restruturação das políticas sociais,
sendo que a promoção da autonomia e indepen-
dência na pessoa idosa são aspetos fundamentais
para o individuo e, consequentemente, para as
suas redes sociais próximas e sociedade onde se
insere.
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